Vascão e Flamengo repetem semifinal que marca series invictas no clássico
O Globo
O léxico da guerra, para o bem ou para o mal, acompanha o futebol desde seus tempos de ritual da civilização maia. O Maracanã, em abril de 2015, teve dias de Stalingrado — a batalha que ficou famosa na II Guerra Mundial pela postura russa de não recuar um centímetro a mais, para interromper de vez o avanço das forças do Eixo. Aquele empate sem gols entre Flamengo x Vasco pelo jogo de ida da semifinal do Carioca, embora fosse futebol, teve a beligerância de um campo de combate: chute de Jonas na cabeça de Gilberto, soco de Dagoberto nas costas de Bressan e nove cartões amarelos.
Na época, o resultado parecia melhor para o Flamengo, que chegou a 11 jogos seguidos sem perder no clássico e precisaria de apenas de mais um empate para avançar à final. Mas aquela partida, na verdade, deu início a uma trajetória invicta do Vasco, que hoje tem a vantagem do empate contra o mesmo Flamengo, às 16h, em Manaus, para chegar a mais uma decisão de Carioca e buscar o bicampeonato.
O Vasco, naquele clássico de um ano atrás, parece ter firmado pacto semelhante ao dos russos na II Guerra: impedir qualquer novo avanço do rival. No jogo de volta da semifinal, Gilberto, de pênalti, deu início à reconquista do território que o clube de São Januário havia perdido em três anos de jejum contra o Flamengo. Hoje, a invencibilidade vascaína já soma oito jogos.
— O jejum nos incomodava. Nunca foi um pesadelo, mas incomodava. Não tivemos uma conversa específica, só colocamos na cabeça que era importante ganhar deles. Nosso presidente fica feliz, e é algo que nos deixa mais fortes — reconhece o zagueiro Luan, que estava em campo no início da série invicta do Vasco.
Enquanto isso, o Flamengo prepara terreno para uma revanche. Ontem, houve até carreata de torcedores atrás do ônibus rubro-negro, que seguia para a Arena da Amazônia para um trabalho de reconhecimento do campo. A Polícia Militar, inicialmente, não queria liberar torcida no treino, por questões de segurança. Na hora, contudo, o calor do público convenceu as autoridades e os portões foram abertos.
Se a semifinal de 2015 pode ser comparada à batalha de Stalingrado para o Vasco, o jogo de hoje virou uma espécie de “Dia D” para o Flamengo. Só uma invasão vitoriosa em Manaus mantém o time rubro-negro vivo na luta pelo título carioca. Além disso, sem vitória hoje, o jejum pode seguir até 2017. Como estão em divisões diferentes do Brasileiro, os rivais só poderiam se enfrentar de novo neste ano em um eventual encontro na Copa do Brasil.
Para o atacante Paolo Guerrero, é também a chance de finalmente balançar as redes contra o Vasco. O clima úmido de Manaus pode ser ainda mais quente para o peruano, que reencontrará o zagueiro Rodrigo, com quem se desentendeu no último clássico, em Brasília, que acabou empatado em 1 a 1.
— Tentamos lidar com a maior tranquilidade possível. Lógico que existe pressão. Mas às vezes esquecemos para baixar a adrenalina — comentou o zagueiro César Martins, que será titular na vaga do suspenso Juan.
SEGUNDA VEZ NA ARENA DA AMAZÔNIA
A torcida vascaína em Manaus também tentou acompanhar o treino da equipe na Arena da Amazônia, na manhã de ontem, mas teve que ficar do lado de fora. A única vez que o estádio recebeu um Flamengo x Vasco foi em torneio amistoso no início de 2015, quando uma falha de Sandro Silva permitiu que Everton garantisse a vitória rubro-negra por 1 a 0.
Aquele era o primeiro clássico após a volta de Eurico Miranda à presidência do Vasco. Incentivador notório da rivalidade entre os dois clubes, que considera um “campeonato à parte”, Eurico precisaria esperar até abril daquele ano para, na batalha de Stalingrado carioca, ver seu primeiro “título” pelo Vasco. A última lembrança vascaína em Manaus é mais favorável: vitória sobre o Fluminense por 1 a 0 no domingo e título, este de verdade, da Taça Guanabara.
Na tentativa de explicar a série invicta no clássico, Luan admite que é um jogo tratado de forma especial não só pelo presidente, mas também pelos jogadores. A estabilidade do time, com espinha dorsal definida sob o comando de Jorginho, também é enaltecida pelo zagueiro.
— O principal trunfo do Vasco é a união. Na defesa, Rodrigo e Martín Silva estão comigo há três anos. Estamos construindo uma família.