quinta-feira, 4 de julho de 2019

Centro de Cultura - um cartão postal negligenciado

Por: Silvio Cunha 
Nos últimos dias, a assessoria de Comunicação Social da Prefeitura de Caxias tem intensificado informações cientificando a população, inclusive através das redes sociais, que o município voltou a dar prioridade à recuperação de logradouros públicos antes abandonados por gestões que antecederam a atual. A iniciativa é alvissareira e contempla o interesse das pessoas que gostam de ver a cidade bela e próspera.
Então, se o trabalho é para valer, porque não incluir todo o complexo arquitetônico do Centro de Cultura Acadêmico José Sarney, que funciona nas antigas dependências da Companhia União Caxiense, inaugurada no final do século 19, e que é ainda a estrutura arquitetônica mais importante de Caxias, a refletir a pujança econômica de período áureo da história da cidade, marcado por imponência e beleza, e, de quebra, renovar a jardinagem da praça Dias Carneiro, a praça do Panteon, que fica diante do mesmo?! Essas duas estruturas públicas do centro da cidade há muito clamam por urgente revitalização. 
Prédio da antiga tecelagem de 1889, tombado para ser o Centro de Cultura 
Quando é visto pela primeira vez em um cartão postal (longe de Caxias, obviamente), imediatamente o eventual visitante desperta o desejo de conhecê-lo de perto, tocá-lo com as próprias mãos, para sentir o esmero de uma edificação planejada na distante Inglaterra, onde seu modelo teve origem, em momento progressista da cultura e do beneficiamento do algodão, aqui na região dos Cocais. Tive oportunidade de fazer o gesto quando criança na década de 1960, naqueles idos em que o complexo estava interditado e fechado para visitas. Mas criança é bicho traquinas, curioso, e assim pude sentir que suas paredes eram revestidas por um tipo de mármore rosa, substituído na reforma por uma pintura que o imitava, grosseira, talvez em razão de não mais encontrar-se peças de reposição do gênero.
A visão de uma das laterias do Centro de Cultura 
Dos prédios das quatro fábricas de tecido que funcionaram em Caxias – fundadas e instaladas na cidade, nos anos 1883, 1889, 1891 e 1892, Companhia Industrial Caxiense, Companhia União Caxiense, Fábrica Sanharó e Companhia Manufatora Caxiense, respectivamente -, o da Companhia União Caxiense foi o único que restou, beneficiado à época da presidência de José Sarney por investimentos federais que a recuperaram na segunda metade dos anos 80 do século passado e que a elevaram, por força de tombamento, não mais para produzir tecidos, influir na economia, ou sediar um intento do grupo empresarial Claudino, mas para estabelecer-se como um centro cultural modelo na região do leste maranhense.
Estava revitalizado, para a alegria e orgulho dos caxienses, o grande marco representativo hoje da história da Princesa do Sertão, destinado para o fim nobre de agregar entre suas paredes a esplêndida representação cultural da terra dos poetas, dos escritores, enfim, daqueles que prezam os mais altos valores que brotam dos sentimentos e que expressam o verdadeiro sentido de se viver como seres humanos. Mas, passados os anos, vê-se que a situação é diferente.
Sem nenhum tipo de fiscalização a área do estacionamento está sendo utilizada
por ambulantes para vender comida  
O primeiro impacto negativo sobre a concepção para que fora criado, adveio com a substituição paulatina de seus espaços interiores para dar lugar a células de trabalho da administração municipal e espaço para investimentos educativos do governo estadual. Até aí, tudo bem. Sua manutenção precisava do apoio do poder público. Só que isso foi levado ao extremo, ao ponto de em determinado momento, por sobrecarga ao seu sistema elétrico, o prédio esteve na iminência de ser destruído por um inesperado incêndio, que só não o arrasou porque sua estrutura esquelética é toda forjada em ferro, e este resistiu bravamente às chamas que ameaçavam sua integridade.
Agora, graças a pressão de artistas locais, a Prefeitura, sob a gestão do prefeito Fábio Gentil (PRTB), sinaliza que fará reformas no prédio, tendo como ponto alto a recuperação do seu cine-teatro relegado às traças por décadas. A decisão é mais que providente e chega em boa hora. Afinal, a classe artística local clamava pela inclusão de um local capaz de reerguer a sétima arte na cidade, assim como evidenciar também o teatro, talvez a mais imaginativa forma que o artista pratica ao interagir no meio em que vive e que leva as pessoas a fazer severas reflexões sobre a existência e melhor sentido para a vida.
Areá de estacionamento do Centro de Cultura foi transformada também em estação
rodoviária de ônibus para zona rural  
A se materializarem rapidamente, as decisões encontrarão a aprovação e o aplauso de todos que amam as artes. Mas, que não fiquem somente no interior da antiga fábrica. Seu espaço externo, toda a área em torno da construção, serve hoje para estacionamento de ônibus que circulam pela zona rural. Mais parece uma estação rodoviária sem administração, e com isso agregando em torno de si, com grande prejuízo ao espaço de estacionamento para os condutores que dirigem nas proximidades do Paço Municipal, todo tipo de vendedores ambulantes, e pior, assistido também por bancas de venda de comida feitas ao ar livre, através de improvisadas e anti-higiênicas tendas rústicas, situações inadequadas que pedem a ação imediata do serviço de Vigilância Sanitária, no sentido de controlar-se e por termo à situação caótica e feia que impera no local. Como não há sanitário público nas imediações, o lugar também é usado como válvula de escape a quem quiser fazer suas necessidades fisiológicas. O conjunto das irregularidades transforma essa parte da área externa do Centro de Cultura em um local repulsivo.
Com a recomendação de que a Prefeitura faça valer a Lei do Código Municipal de Posturas, ação que parte hoje com mais ênfase da Câmara Municipal, o poder público tem a responsabilidade de readaptar todo o espaço do Centro de Cultura no sentido de que ele possa ser visto como um bem comum a todos os caxienses, e não como espaço de sobrevivência a determinadas categorias que se aproveitam da leniência dos agentes de fiscalização e que, por isso, as coisas estão soltas e fora de controle. Imagine a impressão que leva a pessoa que visita a cidade, ao se deparar com a mostra de descaso que impera naquele trecho do Centro Histórico de Caxias! Em todos os cenários possíveis, a resposta será ruim, muito ruim, para os administradores que comandam o município.
Noca